sábado, 4 de outubro de 2008

Comentário do professor Roberto Albergaria sobre o dia dos professores

Este foi um texto produzido pelo professor Roberto Albergaria da Faculdade de Filosofia da UFBA, no ano passado, refletindo sobre o dia dos professores. O texto é "grandinho", mas, o leiam.

LEIAM AGORA:

Dia do Professor: o sonho acabou.


Eu queria falar dos professores. Vários alunos de Renato Mezano fizeram dissertações e teses de doutorado sobre a dimensão sexuada da relação professor aluno. Isso é uma coisa muito interessante. Antigamente, toda aluna que chegava na 8ª série se apaixonava por um professor. Professor de história, português... Depois isso foi caindo de moda. Aí, com a moda da cultura do corpo, elas passaram a ter alguma paixão distante pelo professor de educação física. Mas hoje o professor não inspira mais tesão em ninguém. E é sobre isso que eu vou falar.

Comemoramos no dia 15 de outubro o dia do professor. Mas o que a gente está comemorando finalmente? Nada! Porque o professor é uma figura absolutamente sem valor na sociedade hoje. Professor hoje não desperta nem mais o tesão das alunas. Não desperta o reconhecimento de ninguém porque as pessoas hoje acham que a informação está na internet. Ser professor hoje é uma opção de última escolha quando os meninos fazem vestibular, porque a gente vive numa sociedade espetacular, cidade das artes, cidade de onde o importante é curtir a vida. A nobre figura do professor é apenas uma ilusão.

Quando a gente diz que o professor tem uma nobre missão de iluminar as almas das crianças, abrir a cabeça dos meninos, não tem nada disso. Eu sempre digo a meus alunos que quem abre cabeça de aluno é o buzu da Vibensa quando atropela um na frente da Faculdade de Filosofia. Não existe mais essa história de abrir cabeça. Isso é aquela ilusão iluminista de que o saber é bom. Não é bom meu Deus.

Dos meus alunos todos, durante 30 anos ensinando, poucos deram pra alguma coisa que prestasse na vida. Então o status de professor hoje não é nada. A educação é uma grande ilusão. Esse negócio de que os meninos vão ser coisa boa. Que nada! Os jovens hoje só querem saber de curtir a vida. Os meninos de hoje não querem saber de mudar zorra nenhuma. Cada um cuida de si e o diabo por todos.

As universidades hoje são espécies de “Think Tank”, como os americanos chamam. São tanques de pensamento, onde um monte de cabeção vai criar soluções pontuais pra você apertar fechadura, endireitar uma antena, etc. As universidades públicas, que já tiveram grande função no Brasil, não têm mais. Inclusive elas são extremamente minoritárias. A grande parte do ensino universitário hoje é feito pelas faculdades privadas. Um grande negócio.

Então por conta disso tudo, por conta do mundo que a gente vive, desse capitalismo turbinado, nós professores não temos mais lugar. Nós somos os marginais desse mundo. A educação hoje é ditada pelas normas da Organização Mundial do Comércio e é tratada como uma mercadoria qualquer.

Do ponto de vista do Estado, nós educadores não somos nada. Nós não temos reajuste. A única coisa que teve de positivo nesse governo foi o piso de R$800 para as prefeituras do interior. De resto não existe nenhum estimulo econômico. As Universidades Estaduais não têm reajuste, a Federal não vai ter reajuste até 2050, os sindicatos são todos aparelhados, seja pelo PT ou PCdoB. Ai você vai dizer: “Se você queria ganhar dinheiro não deveria ser professor”. Tudo bem, eu sei. Quando eu decidi ser professor eu gostava. Ainda tinha aquele espírito da nobreza do ensino, etc. Mas também não era pra morrer de fome. Não é pra viver num estado de indigência como todos nós vivemos hoje. A gente não tem mais prestigio nenhum. Além do sexy-appeal, a gente perdeu o prestigio. Ninguém quer estudar pra ser professor, porque é uma profissão sem prestigio, sem valor e sem reconhecimento.

Do ponto de vista ideológico, nós, professores, não valemos mais nada no mercado das ilusões burguesas cotidianas. Qualquer publicitário hoje vale mais que o professor. Os alunos não escolhem mais a profissão de professor. Já existe uma espécie de auto desvalorização por conta desse não reconhecimento na nossa condição. Aí os meninos querem fazer Publicidade pra vender mentira, pra ficar enrolando os outros. Ou então vão fazer Direito pra poder ser bem pago pelo picaretas e ganhar muito dinheiro. Mas nunca ser professor. A própria categoria, o próprio recrutamento dos professores é cada vez menor. Professor de física não existe mais. Professor virou uma figura em extinção. Eu estou triste com essa data. O que a gente comemora nesse dia? O meu dia é um passado perdido.

O pior é que eu não vejo mais mudança para a crise na educação. Essa idéia de solução corresponde a idéia de salvação. Quando nós éramos cristãos a gente acreditava na salvação. Depois que o mundo ficou laico, os iluministas trocaram a idéia de salvação pela idéia de solução. Não tem mais solução para as coisas. Nós já passamos do mundo moderno. Ser intelectual hoje não vale mais nada, porque os mundos intelectuais acabaram. Hoje você tem que ser artista, tem que ser midiático, tem que ser performático. Hoje o mundo é de técnico, de especialista. A própria Universidade já não pensa mais a sociedade, já não discute as grandes questões. A Universidade hoje é uma confederação de pequenos nichos de especialistas. Cada um cuidando de sua própria vida e atendendo aos ditames do mercado. O Ministro da Educação disse, em reportagem da revista Veja, que queria abrir a Universidade para a sociedade. Não é para a sociedade, é para o Estado. Nós não temos mais a função crítica que tínhamos.

A minha associação de classe, que é aparelhada pelo PT, fez um caruru para comemorar o dia dos professores. É uma coisa deprimente isso, porque não se faz nada pelos professores. Todos fazem parte desse grande sistema hoje onde tudo se auto-reproduz sem crítica. Porque quem critica é chato, quem crítica é escroto. Não se pode falar nada ou então fala as tecnicalidades da sua especialidadePor fim, os culturocratas, os burrocratas, e inclusive o Ministro da Educação - que deu entrevista a Veja e não disse absolutamente nada - eles dizem que quando o aluno falha a culpa é do professor. Eu não sei que diabo é isso não. A lei do jogo agora é essa. A proposta das Universidades hoje é você fazer com que os alunos se formem mais pra fazer mais número pra emprenhar as estatísticas. Por isso que estou dando esse depoimento melancólico. Mas essa melancolia é a melancolia da maioria dos professores de hoje. Não vejo nenhum professor feliz da vida e acreditando que vai mudar mais nada não. O sonho acabou.
- Reprodução do comentário do Professor Alberto Albergaria no Jornal da Cidade 2ª Edição, no Dia do Professor (15/10/2007). Artigo publicado na edição de número 5 da Revista Metrópole.
E aí meus caros colegas e amigos?! Concordando ou discordando do professor, na integra ou em parte, em absoluto ou com ressalvas, o que vocês acham??? Vamos lá comentem, pois, eu... NÃO TENHO COMENTÁRIOS!!! É ISSO AÍ MESMO???

2 comentários:

Fabão disse...

♫"Desilusão, desilusão, danço eu, dança você, na dança da solidão"♪

Daiane Oliveira disse...

Ainda tomo uma cerveja com ele! Adorei o texto, massa o seu blog Cristiano!